DA LIBERDADE

Há quem julgue liberdade a potência de tudo querer, ter e fazer. Porém não há liberdade sem um conjunto de coisas dispostas e impositivas. Primeiramente que a liberdade existe inserida em um contexto de condições materiais, como diria Marx. Estas já se encontram prontas ao nascermos. Podemos negá-las a ponto de transformar objetivamente a realidade, mas somente de maneira coletiva e ainda assim limitada às condições que encontramos.
A liberdade, sobremaneira livre ou limitada em algum grau é sempre que possível, causa. E causas tendem a produzir efeitos.
Dessa maneira, os usos da liberdade não se destacam das suas consequências. Podem mesmo estar filosoficamente em consonância com o "tudo posso, mas nem tudo convém", de São Paulo, que alertava sobre as liberdades que conviriam ser evitadas.
Dessa forma, seu usufruto consciente nos leva a adiantar o devir, mas o devir é livre de previsões, pois atrelado a liberdades outras fora da alçada do dito livre.
Dispor de liberdade, então, é como imergir em um jogo. Mas conhecer suas regras, ter habilidades performáticas, perícia em previsão, não raro são inutilidades que fazem as partidas perderem o controle a nosso favor. Também porque, tal como no jogo, a liberdade do jogador interage com liberdades de outros livres e também com os imperativos da situação (regras, estratégias desconhecidas, pouca ponderação de consequências nas decisões, desconhecimento de intenções e reações alheias, tempo de resposta, desatenções às disposições presentes, desconhecimento a determinadas maneiras de jogar etc.).
Ao final, aludindo ainda ao jogo, pode-se ter sensação de derrota ou pode-se enfatizar a ludicidade do jogo. Na vida, ser "derrotado" pode ser substituído por "ter aprendido", "ter obtido experiência", não como um fim, mas como um meio.
Pensar-se derrotada/o pelo usufruto da liberdade, nada mais é do que lançar-se às suas asas sem lembrar dos ventos contrários e das tempestades vindouras. Por isso, nem toda liberdade deve ser usufruída, se não quisermos a encarar as reações de nossos atos livres.

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