À primeira vista chamou-me a atenção a professora de direito
confiante, séria e extremamente inteligente. Uma mulher como poucas nos
ambientes acadêmicos (e como poucas protagonistas): uma mulher negra.
A personagem Annalise Keating, interpretada por Viola Davis,
não é uma mocinha/heroína típica de filmes, séries, novelas e romances. Ela é uma
mulher de carne e osso. É contraditória tal como cada um/a de nós é. Excelente na
sua profissão, mas com um lado obscuro que vai se revelando ao longo da trama.
Essa não é uma característica exclusiva da protagonista. Xs
demais personagens seguem essa mesma lógica. São boas/bons e também são
más/maus. E a quebra desse maniqueísmo nos coloca diante de nós. Tendemos a nos
considerar boas pessoas, mas não abrimos mão de nossos vícios. E guardamos
conosco partes de nosso ser que nos envergonham, que buscamos ocultar a todo
custo.
A quebra do maniqueísmo se revela também nos casos que
Analise e sua equipe (que inclui sua assistente, também advogada, Bonnie
Winterbotton; Frank Delfino, um
assistente misterioso, que ninguém entende, ao certo, sua função e seus/suas
alunxs) defendem.
Esses casos nos fazem desmistificar o ofício da advocacia,
que nos faz levantar diversas indagações éticas, no que se refere à defesa de
criminosxs.
Culpa e inocência são dimensões colocadas diante de nós e
que nos fazem relativizar nossos preceitos moralistas e acusadores de justiça,
pois a trama mostra bem que também somos criminosxs em nossos pequenos delitos
(ou nos delitos que consideramos pequenos porque fomos nós que praticamos) ou
mesmo que somos criminosxs em estado de latência.
Os mais diversos casos que a equipe defende mostram que há
uma teia muito mais complexa do que possamos imaginar por trás de um crime e
que a condenação de uma pessoa por toda a sua vida ou mesmo por uma boa parcela
dela, por uma atitude que a colocou em julgamento, pode soar como algo injusto,
sobretudo quando adentramos, mesmo que pouco, nessa complexidade que pode ter
levado à prática do crime.
Enfim, de maneira sutil, colocando-nos diante de nós mesmos,
fazendo-nos torcer pela absolvição de criminosxs ou pela ocultação de algum
crime, a série leva-nos a refletir sobre uma questão muito atual, que diz
respeito à crescente onda conservadora que pede a condenação seletiva de
determinadxs criminosxs ou mesmo que busca criminalizar quem seja/pense
diferente; além de dar boas lições (também sutis) sobre a importância dos
Direitos Humanos nas sociedades contemporâneas.
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